
Kirchner, a poderosa líder peronista condenada à prisão e inelegibilidade na Argentina

Combativa e temperamental, Cristina Kirchner, líder peronista de centro-esquerda e figura central da política argentina nos últimos 20 anos, abraçou o ativismo na universidade, onde conheceu quem seria seu marido e antecessor na presidência, Néstor Kirchner, formando uma dupla inseparável.
A atual presidente do opositor Partido Justicialista, tão amada por seus seguidores quanto detestada por seus detratores, é a principal opositora às políticas ultraliberais do presidente Javier Milei e sua maior adversária política.
Nesta terça-feira, a Suprema Corte confirmou uma decisão de um tribunal que a condenou em 2022 a seis anos de prisão e inelegibilidade política vitalícia por administração fraudulenta.
Há uma semana, a líder peronista havia anunciado sua candidatura à deputada para as eleições da província de Buenos Aires em 7 de setembro. Se vencesse, iria adquirir imunidade parlamentar.
"Nós, peronistas, ficamos aqui e damos nossos rostos e corpos", disse a ex-presidente de 72 anos a seus simpatizantes após a decisão da Suprema Corte, que a enviará à prisão.
Advogada de formação, sempre denunciou que o caso de corrupção na concessão de obras públicas pelo qual foi condenada carecia de provas. A Câmara de Cassação que revisou a sentença confirmou os delitos, embora dois de seus três membros tenham sido questionados por terem se reunido com o então presidente de direita Mauricio Macri (2015-2019).
Em sua longa trajetória política, que começou como senadora pela província de Santa Cruz (sul), também foi deputada pela província de Buenos Aires, eleita duas vezes como presidente em 2007 e 2015 e como vice-presidente em 2019.
Dias depois de o Ministério Público pedir sua condenação em 2022, ela foi vítima de uma tentativa de assassinato quando um homem disparou duas vezes contra sua cabeça sem que as balas saíssem.
"Sou uma fuzilada que vive", ironizou em um evento recente.
- "Che Milei" -
Kirchner, no oposto ideológico de Milei, criticou as políticas do líder de direita e afirmou que seu plano econômico "tem data de validade".
Também criticou o endividamento com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a política de ajuste no gasto público, que Milei simbolizou com uma motosserra.
"Quer me dizer para que serviu a motosserra, irmão? Porque está claro que seu plano falhou", disse ao presidente pelas redes sociais, onde frequentemente lança ataques afiados, quando o governo solicitou um novo empréstimo ao FMI.
"Burro", "traste" são alguns dos insultos que dirigiu ao atual presidente, que frequentemente a chama de "ladra" e a responsabiliza pelo "desperdício" nas contas públicas durante seu mandato.
- Os "K" -
Filha de um motorista de ônibus e uma dona de casa, Kirchner sempre reivindicou suas origens de classe.
Viúva do ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), falecido em 2010, o estilo do casal ficou registrado sob a marca "K".
Casaram-se quando eram estudantes de Direito na Universidade de La Plata (a cerca de 60 km de Buenos Aires) e tiveram dois filhos: Máximo, parlamentar, e Florencia, cineasta afastada da política. Desde que ficou viúva, tornou-se avó de duas crianças.
"Desde que nos conhecemos, Néstor e eu nunca mais nos separamos", escreveu em seu livro autobiográfico "Sinceramente".
Militantes peronistas, eles ficaram detidos por 17 dias em 1976, pouco antes do golpe que instaurou a ditadura (1976-1983).
A partir desse episódio, dedicaram-se à advocacia em Río Gallegos (sul).
Já na democracia, ambos lançaram-se na carreira política e chegaram à presidência em um plano coordenado. "Pensávamos na necessidade de assegurar ao longo do tempo um processo político virtuoso de transformação", escreveu em seu livro.
Suas duas presidências, em pleno boom das commodities, caracterizaram-se por políticas protecionistas e de assistência social, que aumentaram os gastos públicos.
Enfrentou os proprietários de terras, os grandes meios de comunicação e as instituições financeiras internacionais, embora também tenha apoiado empresários aliados.
Aproximou-se de líderes da esquerda latino-americana, como Hugo Chávez e Fidel Castro.
Durante sua presidência, aprovou o casamento igualitário e uma lei de identidade de gênero.
Em 2019, escolheu Alberto Fernández para a presidência e o acompanhou como vice. Depois, distanciou-se e o criticou severamente pela crise econômica que levou a inflação a 100% em 2022.
Como presidente do Senado, apoiou em 2020 a lei do aborto, o que não impediu sua boa relação com o falecido papa Francisco.
F.dAmico--INP